terça-feira, 8 de novembro de 2016

ODE À FORÇA, À CORAGEM E À RESISTÊNCIA DE TODAS AS MULHERES QUE VIVEM E QUE VIVERAM

Hoje é uma noite muda e afiada
Como uma faca de cortar esperanças.
Hoje a lua é lâmina que estanca o sonho
Segundos antes do golpe.
E o feixe de luz que me vaza os olhos pela insônia é

ÓDIO

Mas quando me aniquilam assim
O que me tomam é minha humanidade.
Porque eu insisto em permanecer

VIVA

E no instante de enlouquecer
No limiar da falta de esperança
Desarrazoada, desmatriada, desumana
No instante antes de descer a lâmina
De eu me esquecer quem eu sou
É o ódio que me traz à razão de novo
É o ódio que me re-humaniza em mim
Constantemente e sempre.
Porque constante e sempre
É a minha desumanização.

Então VIVA eu me esquivo do golpe
O que ia me acertar à cabeça
Bem no meio da minha razão.
Porque é o ódio que me faz não duvidar
É o ódio que me mantem a certeza
De que estou totalmente sã
De que eles estão errados
Que eu não estou louca
E nem descontrolada,
E que eu não preciso ser castigada
Como eles querem fazer parecer.

De que eu estou muito certa
De que eu sou humana
Eu estou muito certa de que:

EU SOU HUMANA

E que continuar acreditando nisso
É a única forma de me manter viva e sã
E que embora não seja necessariamente
Uma garantia disso, é a única forma
De a gente se manter vivas e sãs

É CONTINUAR ACREDITANDO.
EU CONTINUO ACREDITANDO.
E VOU CONTINUAR GRITANDO:

MULHERES, NÃO DESACREDITEM DE SUA HUMANIDADE.

Porque eu estou muito certa
De que a noite se acaba no dia
E que o medo também se finda
Quando já não se tem muita coisa
Além de uma certa alvorada íntima
E um machado, um machado

DE DUPLA LÂMINA

E porque eu estou muito certa
De que eu sou esse machado
De que isso é ancestral e poderoso
Um machado de duas lâminas
Que são duas e uma, juntas, unidas
Uma à outra pela mesma matéria
Que são duas lâminas de extirpar falos
É porque eu tenho uma Labrys
Ainda mais afiada que tua lua
De estancar nossos sonhos
Bem na ponta da minha língua
Bem no meio das minhas pernas

QUE NENHUM FALO IRÁ ME SILENCIAR
QUE MEU SEXO E MINHA LÍNGUA CONTINUARÃO GRITANDO LABRYS:

MULHERES, NÃO DESISTAM DE SUA HUMANIDADE!





Mary Daly, filósofa feminista radical (1928-2010)

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